Cefaleia: causas, variações, sintomas e tratamento
A dor de cabeça é um sintoma muito comum e que acomete inúmeras pessoas, porém o seu diagnóstico não é tão simples quanto parece e é necessário um entendimento maior para que o tratamento seja o mais adequado. A cefaleia pode ser causada por alguma anormalidade grave subjacente, mas geralmente vem de transtornos denominados cefaleias primárias, como a enxaqueca, cefaleia do tipo tensional, cefaleia em salvas e hemicrania paroxística.
Cefaleias de início recente, intensas ou agudas possuem maior possibilidade de estarem relacionadas a um distúrbio intracraniano do que cefaleias crônicas.
Outras causas secundárias e fundamentais a serem consideradas incluem lesões intracranianas, traumatismo craniano, espondilose cervical, doença dentária ou ocular, disfunção da articulação temporo-mandibular, sinusite, hipertensão, depressão e diversos distúrbios médicos gerais.
A intensidade, a qualidade, o local da dor e a duração da cefaleia são informações que podem fornecer os indícios para a causa subjacente.
Diagnóstico
As cefaleias primárias podem ser diagnosticadas principalmente através da história clínica do paciente, ou seja, na anamnese e no exame físico. Para as cefaleias secundárias existem os exames complementares, como a coleta de líquor cefalorraquidiano ou exames de imagem, quando dados trazem sinais de alerta (red flags).
Sinais de alerta (red flags) na avaliação de um paciente com cefaleia
- Cefaleia de início abrupto (atinge a intensidade máxima em menos de 1 minuto)
- Primeira ou pior cefaleia já ocorrida
- Progressão subaguda (dias a semanas) com piora na intensidade/frequência
- Mudança de padrão ou surgimento de um novo tipo de cefaleia
- Novo tipo de cefaleia em pacientes com mais de 50 anos
- Cefaleia em pacientes com sintomas sistêmicos (febre, emagrecimento, rinorreia purulenta, hipertensão súbita, espessamento das artérias temporais superficiais, etc)
- Cefaleia em pacientes com HIV ou câncer
- Cefaleia em pacientes com glaucoma ou outras doenças oculares
- Aura prolongada ou persistente
- Cefaleia que surge ou desaparece com a alteração postural
- Cefaleia em pacientes com história de epilepsia ou traumatismo craniencefálico recente
- Anormalidades no exame neurológico (alteração da consciência, linguagem, motricidade ocular, campos visuais, funções sensitivas ou motoras, papiledema ou sinais de irritação meníngea)
- Cefaleia unilateral estrita ou exclusivamente occipital
- Ausência de melhora com tratamento adequado
- Cefaleia desencadeada pela tosse, atividade física, atividade sexual ou manobra de Valsalva
A coleta de informações sobre a história clínica deve levar em consideração alguns aspectos que fazem parte da rotina da anamnese da dor e que podem auxiliar a codificar as cefaleias:
- Número de crises
- Duração e frequência das crises
- Características da cefaleia: qualidade, localização, intensidade, fatores de alívio e agravantes
- Sintomas associados: fotofobia, fonofobia, osmofobia, náuseas e/ou vômitos, postura ou atitude
- Excluir cefaleias secundárias
Migrânea
A migrânea, ou enxaqueca, é uma doença que se deve principalmente ao fator socioeconômico. Menos de 50% da população recebe tratamento, o número é ainda menor quando se trata dos pacientes que procuram tratamento.
A enxaqueca é uma modalidade de cefaleia primária, intensidade moderada a intensa, pode ser agravada pela atividade física de rotina, associada a náuseas e vômitos, seguida por fotofobia e fonofobia.
Ela pode ocorrer com aura (sintoma neurológico focal que pode ser visual, sensorial ou motor), ou sem aura.
Critérios diagnósticos para migrânea sem aura
- Pelo menos 5 crises, preenchendo os critérios abaixo
- Cefaleia de 4 a 72 horas (sem tratamento ou tratamento ineficaz)
- A cefaleia tem pelo menos duas das seguintes características:
- Localização unilateral
- Caráter pulsátil
- Intensidade moderada ou forte
- Exacerbada por ou levando o indivíduo a evitar atividades físicas rotineiras
- Durante a cefaleia pelo menos um dos sintomas:
- Náusea e/ou vômitos
- Fotofobia e fonofobia
Critérios diagnósticos para migrânea com aura
- Pelo menos 2 crises, preenchendo os critérios abaixo
- Um ou mais dos sintomas de aura a seguir:
- Visual
- Sensitiva
- Fala e/ou linguagem
- Motora
- Tronco cerebral
- Retiniana
- Duas ou quatro das seguintes características
- Pelo menos um sintoma de aura desenvolve-se gradualmente em cerca de 5 minutos e/ou dois ou mais ocorrem em sucessão
- Cada sintoma de aura individual dura de 5 a 60 minutos
- Pelo menos um dos sintomas de aura é unilateral
- A aura é acompanhada, ou seguida, dentro de uma hora, por cefaleia
Tratamento para as crises de migrânea
Estratégia | Medicamentos | Doses | Dose máxima diária |
Paracetamol e anti-inflamatórios não esteroides (AINEs): para o tratamento inicial das crises de intensidade leve a moderada | Paracetamol Ácido acetilsalicílico Ibuprofeno Naproxeno sódico Diclofenaco potássio | 1.000mg 1.000mg 400 a 600mg 500 a 550mg 50mg | 4.000mg 5.400mg 2.400mg 1.375mg 150mg |
Triptanos: crises de migrânea moderadas a graves | Sumatriptana: Oral Nasal Subcutânea Rizatriptana Zolmitriptana Naratriptana | 50 a 100mg10 a 20mg 6mg 10mg 2,5mg 2,5mg | 200mg40mg 12mg 20mg 10mg 5mg |
Crises refratárias | Naproxeno+sumatriptana Di-idroergotamina (apenas os que não respondem ao triptano) Clorpromazina Dexametasona | 500+50mg 500+85mg 2mg 10 a 50mg 4mg | Duas doses 6mg 200mg Fixo por 3 a 5 dias |
Pacientes com contraindicações a fármacos vasoconstritores | AINEs, agonistas dopaminérgicos, analgésicos combinados com cafeína | Individualizar | Individualizar |
Cefaleia do tipo tensional
A cefaleia do tipo tensional pode ser definida como uma dor de cabeça bilateral, não pulsátil, sem náuseas ou vômitos. Os pacientes podem apresentar fotofobia ou fonofobia, mas não ambos, a dor de cabeça não piora com a atividade.
Critérios diagnósticos para a cefaleia do tipo tensional
- Pelo menos 10 crises, preenchendo os critérios abaixo
- Cefaleia durando de 30 minutos a 7 dias
- A cefaleia possui ao menos duas das quatro características:
- Localização bilateral
- Caráter em pressão/aperto (não pulsátil)
- Interatividade leve ou moderada
- Não é agravada por atividades físicas rotineiras
- Ambos sintomas:
- Ausência de náuseas ou vômitos
- Não mais que um dos sintomas de fotofobia ou fonofobia
Fármacos recomendados para o tratamento abortivo da cefaleia do tipo tensional
Fármaco | Dose |
Ibuprofeno | 200-800mg |
Cetoprofeno | 25mg |
Ácido acetilsalicílico | 500-1.000mg |
Naproxeno | 375-550mg |
Diclofenaco | 12,5-100mg |
Paracetamol | 1.000mg |
Analgésicos combinados com cafeína | 65-200mg (cafeína) |
Fármacos recomendados para o tratamento profilático da cefaleia do tipo tensional (quadros muito frequentes ou crônicos)
Fármaco | Dose |
Fármaco de primeira escolha | |
Amitriptilina | 30-75mg |
Fármacos de segunda escolha | |
Mirtazapina | 30mg |
Venlafaxina | 150mg |
Fármacos de terceira escolha | |
Clomipramina | 75-150mg |
Maprotilina | 75mg |
Mianserina | 30-60mg |
Cefaleias trigeminoautonômicas
As cefaleias trigeminoautonômicas são um grupo mais incomum de cefaleias, clinicamente caracterizadas por crises recorrentes unilaterais de curta-duração. São associadas a um ou mais sintomas autonômicos: ptose, hiperemia conjuntival, lacrimejamento, congestão nasal ou rinorreia, ipsilaterais à dor.
Critérios diagnósticos para cefaleias em salvas (mais longas e menos frequentes)
- Pelo menos 5 crises, preenchendo os critérios abaixo
- Dor forte ou muito forte, unilateral, orbitária, supraorbitária e/ou temporal, duração de 15 a 180 minutos (sem tratamento)
- Uma ou ambas das seguintes características
- Pelo menos um dos sinais e sintomas, ipsilaterais à cefaleia
- Sensação de inquietude ou agitação
- As crises possuem uma frequência de 1 a cada 2 dias a 8 por dia em mais da metade do tempo quando a doença está ativa
Critérios diagnósticos para hemicrania paroxística (duração e frequência intermediária)
- Pelo menos 20 crises, preenchendo os critérios abaixo
- Dor forte unilateral, orbitária, supraorbitária e/ou temporal, durando de 2 a 30 minutos
- Pelo menos um dos sinais e sintomas, ipsilaterais a cefaleia
- Crises superiores a 5 por dia em mais da metade do tempo
- Crises evitadas através de doses terapêuticas de indometacina
Critérios diagnósticos para crises de neuralgiforme unilateral de curta duração
- Pelo menos 20 crises, preenchendo os critérios abaixo
- Cefaleia moderada a forte, unilateral, com distribuição orbitária, supraorbitária, temporal e/ou trigeminal, durando de 1 a 600 segundos, pontadas únicas, série de pontadas ou padrão “dente de serra”
- Pelo menos um sinal e sintoma autonômicos cranianos, ipsilaterais à cefaleia
- Crises têm frequência de ao menos uma ao dia em mais da metade do tempo, quando ativa
Critérios diagnósticos para hemicrania contínua (unilateral persistente)
- Unilateral, preenchendo os critérios abaixo
- Presente por mais de 3 meses, com exacerbações de intensidade moderada e grave
- Uma ou ambas das seguintes características:
- Pelo menos um dos sinais e sintomas ipsilaterais à cefaleia
- Sensação de inquietude ou agitação, ou piora da dor devido ao movimento
- Resposta absoluta a doses terapêuticas de indometacina
Tratamento da cefaleia em salvas
Medicação | Doses |
Tratamento abortivo | |
Sumatriptana | 6mg subcutâneo |
Oxigênio | 100% com máscara a 6-12/min, durante 15 minutos |
Sumatriptana | 20mg nasal |
Estímulo do gânglio esfenopalatino | Indicado para forma crônica quando o tratamento medicamentoso é ineficaz |
Tratamento de transição | |
Prednisona | Primeiros 4 dias com dose plena e, após redução gradual em 2 semanas |
Bloqueio de nervo occipital maior | Pode ser feito ambulatorialmente, em única aplicação |
Tratamento profilático | |
Verapamil | Doses mais altas podem ser utilizadas, com monitorização eletrocardiográfica |
Carbonato de lítio | Devem-se monitorar os níveis séricos |
Referências
CECIL Medicina 24 ed. 2014
Cefaleias – Atualização no manejo ambulatorial
CURRENT MEDICINA Diagnósticos e Tratamento 51 ed. 2013
HARRISON Medicina Interna 19 ed. 2017
Observação
As informações listadas acima podem conter erros de digitação e/ou atualizações e devem ser verificadas nos livros citados, que foram utilizados como fonte de pesquisa.